Ficamos sem TV. Que sorte...

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Quando as crianças se preparavam para dormir, uma de nossas filhas perguntou: "Mãe, como faremos quando voltar a televisão?".
Vivemos um período inusitado para uma familia dos tempos modernos. Estamos praticamente sem televisores em casa. Uma onda repentina e sequencial de quebradeira atingiu aparelhos da família. Algo similar à entrada e à ocupação das tropas russas em Pristina, Kosovo. Ninguém esperava, súbita e fatalista.
Não obstante a sensação inicial de desvalia e desconsolo, com o passar das noites fomos observando os benéficos resultados dos indesejáveis enguiços. Ficamos até espantados com tantos benefícios... o tempo de conversa familiar aumentou; o piano (relíquia de família) voltou à ativa. E como...; intensificou-se a leitura de livros, individuais e em conjunto; jantares mais serenos, participativos e conversativos; e, pelo menos uma vez por semana, reumino-nos para rezar juntos. A despeito dos constantes shows de música e dança encenados pela caçula, o nível do volume do som geral baixou, em tempos de carência de silêncio e excesso de ruído.
Se a falta de televisão apresentou-nos mais vantagens do que desvantagens, o que tem sido deficiente na televisão?
Primeiramente, o televisor é utilizado como "máquina de fazer silêncio". Não silêncio ambiente; ao contrário, os níveis de som são altíssimos, principalmente quando entram os comerciais. Porém, o silêncio entre as outras pessoas presentes. Sentados à volta da telinha luminosa (que já não é tão pequenina assim...), quando alguém esboça um comentário qualquer recebe, quase imediatamente: "Espera! Deixa eu ouvir!" Quando não ocorre até o reprovável "Cala a Boca!".
Ora, o uso da televisão seria um fantástico meio para gerar discussões e debates, diferentemente do "você decide, na opção A ou na opção B", sem senso crítico, analítico e perscrutador. As possibilidades educacionais do esplêndido meio de comunicação vêm sendo minimizadas. Exceto certos progamas das TVs Educativas e Cultura.
Ademais, o nível de qualidade da progamação caiu ao ridículo. Mormente uma agenda sensacionalista, exploradora das misérias sociais, morais e artísticas. Os conteúdos temáticos de filmes, desenhos animados, progamas diários de variedades e telenovelas têm apresentado verdadeiro atentado à moral e aos bons costumes.
Nesse período sem TV em casa, ao não acompanharem certos progamas, sistematicamente, nossas crianças deixaram de fazer usos de certas expressões verbais, palavras indelicadas e até de "pseudodanças" de gosto duvidoso.
Cabe ainda registrar os efeitos perniciosos das mensagens subliminares das propagandas de bebidas alcoólicas, cigarros e prostituição sexual (nas variantes do telessexo) veiculadas em todos os horários. Passam uma concepção, aos seres imaturos, de que aqueles que usam são os mais bonitos, elegantes, fortes e vencedores.
Por tudo isso, o enguiço dos televisores, inicialmente desagradável, proporcionou valiosas oportunidades de análise, reflexão e conclusão, no que diz respeito à acessibilidade e impressões que as crianças recebem. [...]

O retorno da TV

No momento em que vislumbramos o retorno dos aparelhos (penso que se tornaram indesejáveis...), iniciamos em casa uma discussão circular de como proceder. Para não ficarmos olhando-os como se fossem monstrinhos, estabeleceremos certas regras de convivência.
Primeiramente, o tipo de progamação será devidamente selecionado, buscando qualidade de vida, a que engrandece o indivíduo e não subestima sua capacidade de vida, apuro de gosto e delicadeza humana. Não desejamos progamas de baixo nível. Desliga-se...
Outra regra será quanto ao horário de utilização. A hora do jantar, da prece familiar, da música, da conversa... é inviolável. O televisor é complemento, não ator principal.
E o volume? Ih, essa será uma luta... Verdadeiro exercício de respeito ao espaço do outro. O vizinho não está obrigado à acompanhar e ouvir o que estivermos assistindo.
Por fim, a a prioridade será absoluta para a conversa. a palavra que vale é "pessoa". O espaço de convivência poderá ser enriquecido com o uso da TV. Todavia, como instigador e estimulante para falar, discutir e conversar. Para estar com o outro.


Palmiro F. da Costa.
Disponível em: http://observatório.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/qtv120220032.htm
Acesso em: 15 jun. 2005. (Texto adaptado.)



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Um comentário:

  1. (...) quando alguém esboça um comentário qualquer recebe, quase imediatamente: "Espera! Deixa eu ouvir!" Quando não ocorre até o reprovável "Cala a Boca!". UAISHAUSIAHS sempre faço isso ;x

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